Sempre dão o que falar, como diriam os mais antigos.
Para quem não sabe o que é a "Laje", eu não vou responder. São aquelas coisas que você sabe ou não saberá nunca. Posso somente dar uma dica: É um certo estado de espírito.
Poderia pertencer a todos. Felizmente ou infelizmente pertence àquela tribo e a outros espíritos soltos pelo mundo. Grupos de intelectuais encontram-se semanalmente para discutir o assunto. Há muita divergência.
Brunch eu também não vou explicar. O Deus Google está aí para responder às suas preces.
Tudo esclarecido, vamos aos fatos:
O seu sonho desde o nascimento era morar na zona sul. Sua mãe conta que a primeira palavra pronunciada foi Dias Ferreira. Sempre foi precoce.
Por circunstâncias da vida morava na Tijuca. A Tijuca é um bairro "meio". Meio tudo.Não está nem no subúrbio nem na zona sul. Fica na fronteira É um bairro confuso e isto traumatiza irremediavelmente seus moradores. Eles ficam vagando entre dois mundos. Alguns enlouquecem definitivamente.
Nossa querida tijucana trabalhou e juntou dinheiro para finalmente realizar o seu sonho, e definitivamente ser feliz. A felicidade está sempre lá, sempre no outro, depois do túnel,sempre nas areias douradas dos eleitos. Há controvérsias! Ninguém ainda sabe direito que p**%5&¨**rra é esta!
Finalmente chegou o grande dia. Ela chegava a tremer de emoção. Com lágrimas nos olhos, finalmente acenou com o lenço branco para as pessoas que ainda trafegavam pela Saens Peña à procura de uma saída. Alguns carregavam fotos de Ipanema. Outras uma sacolinha com areia da praia da Barra.
Ela manteve o sorriso triunfante e sequer deu uma última olhada. Não havia tempo para o passado.
Chegou como saiu. Sorridente e com pequenas gotas de lágrimas no olhar. Agora, de emoção.
Como o dinheiro arrecadado, alugou com possibilidade de compra futura, um duplex com cobertura, que ela ainda insistia em chamar de terraço ou laje.
Ficava próximo da Dias, onde à tardinha, com seu vestido florido e esvoaçante, saíria para as compras e depois comer biscoitinhos amanteigados com chá de equinácea, que era o hit da estação. Teria que lembrar de cruzar as pernas delicadamente, como a tribo sulista. Tinha que adquirir novos hábitos. Tinha que tirar a Tijuca de dentro, a fórceps se preciso.
A brisa vinda do mar entrava em sua sala e ela suspirava, suspiro que só poucos suspiram.
Tudo perfeito. Finalmente!!
Coincidiu que no dia de sua mudança, era também seu aniversário. Resolveu dar uma festa, chamando os seus amigos e parentes da distante Tijuca. Seria uma despedida.
Daqui para frente, novos amigos, novos amores, nova vida! Animada com a ideia, resolveu fazer um brunch. Não sabia direito o que aquilo significava. A Caras não podia estar errada. Montou um menu chic, saboroso e simples. Ainda não estava pronta para a gastronomia molecular.
Pensou ir na Colombo, mas era próximo demais, preferiu não correr riscos. Optou por um bolo de abacaxi com coco. Simples e imortal.
Como o brunch estava marcado para às onze horas da manhã, começaria com uma mesa de pães finos da melhor padaria. Padrão Paris. Queijos, frutas, frios embutidos, geléias, água de coco e sucos naturais com frutas da época. Ela adora frutas da época, seja ela qual for.
Depois mini barquetes de frango ao curry, feitas com aquelas massinhas já prontas. Por cima, o sexagenário fio de ovos.
Um pouco mais tarde, serviria os empadões de frango e camarão, que sua empregada Ademilda faz divinamente. Pessoa simples, e ainda desnorteada com tanta novidade ela parecia andar meia dopada. Seu último trabalho era vender dobradinha na Central do Brasil. Os argumentos da tijucana para tirá-la de lá foram fortes, mas ela andava se perguntando o que estava fazendo ali.
Para beber, clericot. Feito só no rosé.
Sem ter um vasilhame próprio, improvisou e fez uma poncheira com o lustre da sala de estar. Tinha certeza que seria copiada no subúrbio. Quem mais apropriado para ressuscitar o clericot? E ainda mais no rosé?
Como conhecia o perfil dos convidados, montou um menu emergêncial, para o caso do evento se estender um pouquinho. Quando escurecesse, acenderia a churrasqueira, colocaria linguicinhas, queijo coalho, cebolinhas e batatinhas. Seria o must!
Depois de um dia exaustivo na cozinha, estava tudo pronto. Achou por bem receber no terraço, queria esnobar com a brisa marinha e a vista dos edifícios em frente. Ia abalar.
Mesa lindamente decorada, quase não se via a comida. Decoração ambiente com grandes flores de papel. O curso de artesanato foi de grande valia neste momento. Som na altura e qualidade certa. Pensou que talvez mais tarde, poderia colocar um funk leve. Sem saber que isto não existia. Achou tudo lindo e ria antecedendo o prazer. Antes do banho e da escova progressiva, lembrou da maçã do amor. Era viciada. Não perdia uma quermesse tijucana, ia em todas, encostava na barraquinha das maçãs, e só se dava por satisfeita depois de engolir uma quantidade que para alguns seria motivo de internamento. As fofoqueiras de plantão comentavam que era falta de marido. Ela não estava nem aí. Ia embora levando meia dúzia. Gostava tanto que aprendeu a fazer, e depois de muita persuasão, me repassou a receita. Transcrevo como recebi.
É fácil, precisando somente de uma boa dose de amor. Quem não tem não faz.
Maçã do Amor para quem tem.
Ingredientes:
- 6 maçãs bem vermelhinhas;
- 2 1/2xícaras de açúcar mais grossinha;
- 5 colheres de sopa bem geladinha, acabada de sair da geladeira;
- 1 colher de sobremesa de corante alimentício vermelho, de um vermelho bem vermelhinho;
- 1 colher de sobremesa de suco de limão, cuidado com as mãozinhas na hora de espremer.
Modo de Preparo:
- Lave e seque carinhosamente as maçãs.
- Prepare um tabuleiro limpo e liso para receber as maçãs depois de carameladas, seque bem o tabuleiro e polvilhe-o com açúcar fininha.
- Espete delicadamente com um palito de churrasquinho cada uma das maçãs, tome cuidado para não atravessá-las. Você consegue!
- Em uma panela junte o açúcar, o corante a água gelada e o suco de limão e leve ao fogo mexendo sempre. Cuidado para não se queimar!
- Meu amorzinho, quando a mistura se tornar uma calda espessa e brilhante, você terá de testar o ponto. Tenha muito cuidado, viu?
- Para testar o ponto, use um palito para pegar um pouco da calda e jogue-o em um copo de água, se a calda endurecer está no ponto, retire do fogo. Aiii!Jesus! Se você queimar, vai doer!
- Segurando pelos palitos passe as maçãs na calda até que elas fiquem bem cobertas, você pode ir virando a panela junto para ajudar, coloque as maças no tabuleiro que você preparou antes e deixe secar.
- Embrulhe-as em papel celofane a amarre uma fitinha de cetim colorida. Vai ficar uma graçinha e seu amorzinho vai adorar! Beijinhos no coração!
Infelizmente, a sorte não estava do lado dela.
Os convidados, na ânsia de tirar uma casquinha do mundo idealizado, começaram a chegar às dez horas. Falando alto e já reclamando da música.
Alguém gritou: "Coloca um funk aí, p**%5&**orra!"
Já visivelmente nervosa, nossa anfitriã, atendeu ao pedido. O clericot rolava solto e já dava sinais de que não saciaria a sede desértica dos convidados. Correu à cozinha para fazer mais. Tinha acabado o lícor. Sem saída, colocou açucar numa cachaça, juntou o espumante e o restante das frutas. Ninguém ia perceber!
Realmente, na bebedeira em que estavam, ainda acharam melhor do que o anterior.
Acabou a comida da mesa lindamente decorada com flores de papel. O empadão da Ademilda nem chegou a ser servido, invadiram a cozinha e comeram todos. As maçãs jogadas no chão e pisoteadas. Ninguém comeu. Até para eles, era demais!
Nossa tijucana, visivelmente abatida, correu para a churrasqueira. Ademilda, solícita, tentava ajudar em vão. Nada mais poderia ser feito para evitar o desastre. O charmoso churrasquinho acabou em cinco minutos.
Perto da meia noite, a vizinha toca a campanhia. Ademilda abre a porta e vê a Valeska Popozuda, perguntando por que não havia sido convidada. Ela corre para avisar à patroa, que está paralisada numa poltrona enquanto um convidado rebola na sua frente. Os olhos estão vidrados. Não se sabe de desejo ou de loucura. Esta altura do campeonato tanto faz. Ser vizinha da Popozuda é demais para os seus nervos. Enlouquecida saí correndo pelas escadas, gritando e rindo alto.
Para desespero dos familiares, nunca mais foi encontrada. Algumas pessoas dizem que ela foi avistada andando sem rumo entre Ipanema e o Leblon, com a roupa rasgada e cantando um funk, que somente quem sabe desta história entende. A letra diz assim:
Ôôô brunch na laje, olha o brunch na laje,
Pô,pô,pô,Popozão
Não vai não, não vai não!
É o bonde da Tijuca
Clericot na mão!
Clericot na mão!
Desconfio que será o sucesso do verão que se aproxima!
Abraços,
Dino Rosa - Cozinheiro
Os convidados, na ânsia de tirar uma casquinha do mundo idealizado, começaram a chegar às dez horas. Falando alto e já reclamando da música.
Alguém gritou: "Coloca um funk aí, p**%5&**orra!"
Já visivelmente nervosa, nossa anfitriã, atendeu ao pedido. O clericot rolava solto e já dava sinais de que não saciaria a sede desértica dos convidados. Correu à cozinha para fazer mais. Tinha acabado o lícor. Sem saída, colocou açucar numa cachaça, juntou o espumante e o restante das frutas. Ninguém ia perceber!
Realmente, na bebedeira em que estavam, ainda acharam melhor do que o anterior.
Acabou a comida da mesa lindamente decorada com flores de papel. O empadão da Ademilda nem chegou a ser servido, invadiram a cozinha e comeram todos. As maçãs jogadas no chão e pisoteadas. Ninguém comeu. Até para eles, era demais!
Nossa tijucana, visivelmente abatida, correu para a churrasqueira. Ademilda, solícita, tentava ajudar em vão. Nada mais poderia ser feito para evitar o desastre. O charmoso churrasquinho acabou em cinco minutos.
Perto da meia noite, a vizinha toca a campanhia. Ademilda abre a porta e vê a Valeska Popozuda, perguntando por que não havia sido convidada. Ela corre para avisar à patroa, que está paralisada numa poltrona enquanto um convidado rebola na sua frente. Os olhos estão vidrados. Não se sabe de desejo ou de loucura. Esta altura do campeonato tanto faz. Ser vizinha da Popozuda é demais para os seus nervos. Enlouquecida saí correndo pelas escadas, gritando e rindo alto.
Para desespero dos familiares, nunca mais foi encontrada. Algumas pessoas dizem que ela foi avistada andando sem rumo entre Ipanema e o Leblon, com a roupa rasgada e cantando um funk, que somente quem sabe desta história entende. A letra diz assim:
Ôôô brunch na laje, olha o brunch na laje,
Pô,pô,pô,Popozão
Não vai não, não vai não!
É o bonde da Tijuca
Clericot na mão!
Clericot na mão!
Desconfio que será o sucesso do verão que se aproxima!
Abraços,
Dino Rosa - Cozinheiro